Para abordar este tópico, se faz necessário detalharmos o conceito de remissão para os casos de depressão. Primeiramente, quanto à remissão há objetivos agudos, intermediários e de longo prazo. Existe um consenso de que os critérios para remissão nos casos de TDM deva satisfazer, pelo menos, dois critérios: o paciente deve estar assintomático (critérios para diagnóstico do transtorno / mínimos sintomas residuais) e ter melhora das funções psicossocial e profissional. O objetivo intermediário é impedir a recidiva, eliminar qualquer sintoma residual e restaurar os pacientes ao seu nível anterior de funcionamento. O objetivo de longo prazo é impedir episódios futuros. Quando o paciente estiver assintomático por, aproximadamente, seis meses, terá ocorrido recuperação do episódio. (AHCPR, 1993; American Psychiatric Association, 2000; Bauer e Helmchen, 2000)
Quanto aos processos de intervenção dos transtornos depressivos, geralmente, indica-se psicoterapia para os casos leves, psicoterapia e/ou tratamento farmacológico para os casos moderados e graves (MATOS et al., 2006). Nos casos moderados e graves, se o paciente tiver pensamentos ou intenções suicidas, é necessária atenção redobrada, podendo-se considerar a internação numa ala psiquiátrica, às vezes, até mesmo sem o consentimento do paciente (BAUER et al., 2009). A psicoterapia combinada (farmacoterapia e psicoterapia), ajuda pacientes e famílias a consolidarem as habilidades aprendidas na fase aguda a conviverem com as sequelas psicossociais, a vivenciarem, efetivamente, os estressores ambientais e a compreenderem os conflitos internos desencadeadores de uma recorrência de quadros depressivos (BIRMAHER et al., 1998).
A combinação da farmacoterapia e da psicoterapia apresenta melhora na resposta ao tratamento, redução das taxas de recidiva, aumento da adesão à farmacoterapia e melhoras na qualidade de vida do paciente (SEGAL et al., 2001). Esta forma de intervenção é preferível à farmacoterapia aplicada isoladamente no tratamento de pacientes ambulatoriais com depressão maior. Os pacientes ficam menos propensos a abandonar o tratamento, considera-o, significativamente, mais aceitável e estão mais propensos a se recuperarem, em comparação à intervenção só com antidepressivos (DE JONGHE et al., 2001). Estudos ainda evidenciam e apoiam a impressão clínica generalizada de que o tratamento combinado (farmacoterapia e psicoterapia), em pacientes com formas crônicas de TDM, é, significativamente, mais eficaz do que o uso de qualquer um dos outros processos de intervenção propostos isoladamente (KELLER et al., 2000; THASE et al., 1997).
A TCC é uma das psicoterapias que apresentam mais evidências empíricas de eficácia no tratamento da depressão, quer oferecida de forma isolada, ou em combinação com farmacoterapia (POWELL et al., 2008). Também é a mais bem pesquisada forma de tratamento envolvendo qualquer transtorno psicológico (BECK, 2005). Vários estudos indicam que a TCC é efetiva no tratamento da depressão, seja leve, moderada ou grave, e é tão ou mais robusta do que a farmacoterapia ou outros tipos de intervenções psicológicas. Apesar destes resultados, é importante destacar que a terapia cognitiva não deve ser aceita como uma panaceia psicoterapêutica para a depressão, pois, alguns pacientes podem não responder a este modelo de terapia, precisando ser direcionados para intervenções alternativas. (DOBSON, 1989)
Muitos estudos apresentam benefícios, como: resposta mais duradoura em comparação com o tratamento farmacológico e um efeito, substancialmente, protetor quanto às recorrências. A TCC pode ser tão eficaz quanto os medicamentos no tratamento agudo de pacientes ambulatoriais deprimidos e parece ter um efeito duradouro que reduz o risco de recaída subsequente após o término do tratamento. O tratamento com a combinação de medicação e TCC mantém os benefícios específicos da psicoterapia e pode aumentar a probabilidade de resposta sobre qualquer monoterapia, especialmente em depressões crônicas. (HOLLON et al., 2005; HOLLON et al., 1991)
Um grande ensaio clínico envolvendo 681 pacientes com depressão maior não-psicótica foi realizado por Keller et al. (2000). O estudo se propôs analisar os resultados de três grupos específicos, com o objetivo de comparar e verificar a eficácia da Terapia Cognitiva Comportamental, da farmacologia e do tratamento combinado entre as duas modalidades de intervenção. O primeiro grupo foi submetido somente a intervenção de farmacoterapia com antidepressivos (Nefazodona), o segundo grupo a um modelo recentemente desenvolvido de Terapia Cognitiva, o Sistema de Psicoterapia de Análise Cognitivo-Comportamental; e o terceiro grupo ao tratamento combinado (farmacoterapia e psicoterapia).
As taxas gerais de resposta ao tratamento (diminuição ≥ 50% da intensidade dos sintomas basais) foram favoráveis em todos os experimentos, porém, o tratamento combinado (farmacoterapia e psicoterapia) foi, significativamente, mais eficaz do que o uso de qualquer um dos outros processos de intervenção propostos isoladamente pelo estudo. Entre os pacientes que completaram as 12 semanas de tratamento, as taxas gerais de resposta foram de 52% no grupo de psicoterapias (intervalo de confiança de 95%, 44,6% a 59,6%), 55% no grupo nefazodona (intervalo de confiança de 95%, 47,5% a 62,6%), e 85% no grupo de tratamento combinado (95%, 79,7% a 90,2%), no momento da última visita de acompanhamento. Já as respectivas taxas de remissão entre os pacientes que completaram o estudo foram: 24% na psicoterapia, 22% no grupo nefazodona, e 42% no grupo de tratamento combinado, no momento da última visita de acompanhamento. Esses resultados reforçam as recomendações, baseadas em experiência clínica, para o uso de psicoterapia e medicação para tratar pacientes com depressão crônica. (KELLER et al., 2000)
Quanto às taxas de resposta obtidas neste grande ensaio clínico, em qualquer um dos modelos de intervenção aplicados isoladamente, seus resultados foram semelhantes, assim como às taxas relatadas em estudos anteriores de antidepressivos para o tratamento de formas crônicas de depressão em pacientes ambulatoriais, indicando, pelo menos, a eficácia das Terapias Cognitivas Comportamentais no tratamento de pacientes depressivos. Embora igualmente eficazes, a nefazodona produziu efeitos mais rapidamente, porém, em contrapartida, apresentou maior frequência de eventos adversos. Os eventos adversos nos grupos que receberam nefazodona foram consistentes com os efeitos colaterais conhecidos do medicamento, sendo dor de cabeça, sonolência, boca seca e tontura os mais comuns. Além destes, foram observados disfunção sexual (incluindo impotência, disfunção psicossexual, anorgasmia e ejaculação anormal) em 3,5% dos pacientes do grupo nefazodona, nenhum dos pacientes do grupo de psicoterapia, e 3,5% dos pacientes no grupo de tratamento combinado. (KELLER et al., 2000)
CONSIDERAÇÕES:
Conforme abordado neste artigo, ficou evidenciado através de estudos, que o tratamento combinado, farmacoterapia e psicoterapia é, significativamente, mais eficaz do que o uso de qualquer um dos outros processos de intervenção propostos isoladamente.
Autores: ALMEIDA NETO, Anardino Cândido de; FERREIRA, Lucas de Souza.
REFERÊNCIAS
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